Morte dos bovinos salvos da farra do boi em Santa Catarina
Mais uma vez, no estado de Santa Catarina, bovinos foram mortos pelo poder público, após terem sido salvos da crueldade da Farra do Boi por ativistas.
Vamos propor uma reflexão crítica sobre o ocorrido e tentar enxergar a lógica torta usada para “justificar” as ações.
No estado de Santa Catarina, vigora a Portaria SAR 60 de 2016 da Secretaria de Agricultura, que estabelece o Sistema de Identificação Individual e Rastreabilidade de Bovinos e Bubalinos de Santa Catarina, como uma forma de controle sanitário do rebanho do estado. A norma criou a obrigatoriedade da identificação dos animais, sob pena dos animais serem apreendidos e sacrificados sem indenização.
Art. 4º Todos os produtores rurais ou pessoas que a qualquer título tenham bovinos e bubalinos sob sua responsabilidade e não cumprirem as atividades previstas nestas diretrizes ou dificultarem sua execução ficarão sujeitos às seguintes sanções disciplinares e/ou medidas sanitárias, isolada ou cumulativamente, a critério da autoridade responsável pela autuação:
IV – apreensão e abate ou sacrifício sanitário dos animais, sem direito a indenização;
Em episódio semelhante no passado, quando a ONG Acapra também lutou na justiça para salvar bois resgatados da “farra”, entre os argumentos do órgão responsável se encontravam: “solução prática” e o “risco sanitário” ao rebanho do estado.
Então, vamos tentar quebrar essa lente que embaça a visão de muitos e fazer a desconstrução dessa lógica perversa.
O principal argumento para o abate dos animais é que seriam uma ameaça sanitária ao rebanho do estado. Ora, como saber se o animal representa uma ameaça de doença se nenhum exame foi feito, e se não há sinais clínicos de doença? Por que não permitir o isolamento e os testes diagnósticos necessários?
A morte compulsória é reduzir e simplificar o debate! Uma coisa é o sacrifício de um animal doente, com diagnóstico de doença transmissível e intratável, um risco concreto. Outra bem diferente é um animal sadio, sem sinais de doença, ser abatido. Medidas simplistas e “práticas” que desafiam a moral transmitem e ensinam mensagens de valores que nem sempre podemos admitir, quando desejamos um mundo melhor.
Os órgãos responsáveis também usam o princípio da legalidade como justificativa. Se agarram à norma, como se pudessem se despir de qualquer consideração moral. Vale comentar que a legalidade não é um princípio absoluto, devendo ser avaliado o caso concreto, pois muita injustiça já foi cometida com base na legalidade.
Vivemos em um mundo em que sempre são usados “aspectos econômicos” como forma de convencimento, como se as questões morais fossem menos importantes, como bem lembra o jurista Michael Sandel no livro “O que o dinheiro não compra”.
Para concluir, esse argumento de que os animais representam “sérios riscos de disseminação de doenças variadas” é, no mínimo mal intencionado, pois o controle feito pelo Estado, com as vacinações obrigatórias, está longe de garantir a segurança total do rebanho, haja vista a variedade de doenças que são identificadas nos abatedouros.
Texto: Renato Silvano Pulz
Mais informações: https://www.nsctotal.com.br/…/cidasc-abate-animais-resgatad…
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